sábado, 20 de fevereiro de 2010

Alucinado


Ainda te amo,
Como da primeira vez que te senti,
Ainda te amo,
Num amor, que sempre exprimi,

Não sei o que seria sem ti
Só sei que não me arrependi
Não sei se é loucura, paixão,
Ou ensejos que estrelas brilho dão,

Te amo profundamente,
Me enlaçaste na raiz,
Onde me cruzei perdidamente
Num sentimento feliz…

Eu te amo…
Como não amei ninguém,
Não tenho solidão, te tenho
Me sinto ancorado em ti
Te amo na exuberância
Do agora e do passado,
Te amo.

20/02/2010
Karl d’Jo Menestrel

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Um esclarecimento

Porque uma chamada de atenção me foi feita, acrescento o porquê da mudança de Blogue dos escritos de "Gin Quanto Baste", para Blogue próprio. http://ginquantobaste.blogspot.com

A escrita irá traçar o que se passou na realidade, sem esconder nada de nada, nem nas palavras ao tempo empregues pela gente moça no serviço militar... vai existir de tudo um pouco, só não vou escrever sobre sangue e muito pouco sobre morte, mas existirá sexo a sobrar, álcool que um toma mas que embebedava dez.

Irá existir algum calão português e gíria popular grosseira, que na altura, a rapaziada de caserna falava... quando não entender uma frase ou palavra, anote e passe ao e-mail, também pode recorrer ao google para encontrar algum significado para o calão português.

Nos próximos escritos será a chegada à Beira, Moçambique, é aí que começa verdadeiramente uma longa história de dois anos, que não deixam saudades mas sim uma carimbada indelével em envelope branco quase imaculado.

Logo na primeira noite africana Carlos tem o primeiro contacto com a realidade humana que o vai envolver. O clima por aquelas bandas é quente, diria tórrido.

Não existem pesquisas para estes escritos, são relatos verdadeiros que ficaram gravados na memória do personagem principal, são alguns dos momentos que circunscreveram um mancebo dos 22 aos 24 anos.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Gin Quanto Baste


Devido ao conteúdo literário das próximas resenhas, e  não querendo ferir a susceptibilidade de alguns leitores e leitoras a continuação destes exóticos escritos estarão em sede própria em http://ginquantobaste.blogspot.com/

Gin Quanto Baste - Parte I - Primeiros Momentos * * Durante o Voo **

Imagem de despedida de Lisboa (Actual ponte 25 de Abril, na altura denominada ponte Salazar)

Carlos retirou o cinto, que o ajustava na cadeira quando existiu autorização para tal, ajeitou-se no assento, puxou por um cigarro que acendeu de imediato e ofereceu o maço ao moço que seguia a seu lado, um mulato Cabo-Verdiano Furriel enfermeiro.
- Queres um cigarro?
- Não, não fumo, obrigado.
- Incomoda-te que fume?
- Não pá, fuma á vontade, replicou o Cabo-Verdiano.
 Na altura não havia tantos africanos em Portugal como hoje em dia, Carlos volta à conversa enquanto saboreava o cigarro.
- De onde és?
- Sou Cabo-Verdiano da cidade da Praia.
-E a tua especialidade? Pergunta Carlos.
- Enfermeiro
- Eu sou Sapador de Engenharia e vou para Vila Cabral em Moçambique, e tu?
- Vou também para Moçambique para o Hospital de Mueda.
- Vou para uma companhia de Engenharia, replicou Carlos
Feitas as apresentações, ficaram os dois mudos, Carlos continuou fumando o cigarro enquanto olhava pela janela do avião, só via nuvens por baixo, estranhava não ver mais nada que não o sobre voo sobre os castelos de nuvens.

Terminou o cigarro e voltou a dirigir-se ao mulato.
- Os gajos dão qualquer coisa para trincar, ou é a seco até Luanda, ainda são algumas boas horas até lá?
- É pá não sei, quando vim de Cabo-Verde para cá, deram um prato de carne e era menos tempo, mas também foi na TAP (Transportes Aéreos Portugueses) agora com a tropa, não sei.
- A carne para canhão é tratada a pão e água, se calhar não vai haver nada para matar o bicho.
- Ná Pá, com os graúdos que aqui vão! Vais ver que dão no mínimo almoço à maralha, retorquiu o mulato à intervenção de Carlos.
Novamente os dois se quedaram mudos e retornaram aos pensamentos de cada um, enquanto eram embalados pelo barulho dos motores.

Carlos começou a recuar no tempo e a recordar-se de como tudo tinha começado até ali.

Tudo se iniciou em Agosto de 1969 quando das inspecções para o serviço militar, por essa altura com 18 anos, Carlos sonhava em ficar livre da “tropa”, pois tem uma deficiência visual num dos olhos de nascença, para mal dos seus pecados, naquele ano tudo foi aprovado, até um coxo, bem coxo ficou aprovado. A aprovação de Carlos foi para todo o serviço militar, na gíria dos mancebos da altura “ Carne para canhão”.
Estudava em Lisboa, tinha acabado os estudos secundários na capital do Alto Alentejo e para continuar os estudos só na Capital. O exame ao físico era feito no D.R.M. (Distrito de Recrutamento Militar), os das aldeias iriam fazer um bailarico da passagem “se consideravam agora homens”, nalguns a barba mal tinha começado a despontar. Toda aquela fila de mancebos nus era caricata… E quando um capitão médico os mandava dobrar para espreitar o que não vê? Alguns não resistiam e davam a sua gargalhada, para logo um Primeiro enfermeiro, os mandar calar e guturalmente gritar “Silêncio”.
Na saída não existia festa, todos sabiam o destino, as guerras no Ultramar Português se tinha iniciado em Angola em 1961 e rapidamente se propagara à Guiné e a Moçambique, poucos seriam os que ficariam na Metrópole (Portugal), a ver a banda passar. Os de maior sorte, iriam para Timor, Macau ou para S.Tomé, mas eram poucos os que alcançariam estes paraísos, pela certa teriam o continente africano no seu caminho e como companhia a mais fanática companheira durante os dois anos de estadia a “gatilhografa” standard do Exercito Português, a menina mais estimada, a famosa G3.

Lembrou-se de como foi parar á Arma de Engenharia. Tinha feito os psicotécnicos durante a recruta, para tentarem saber das melhores aptidões. O resultado dos mesmos nunca os soube até à semana de campo, a penúltima semana de recruta. Na semana de campo foi indigitado para comandar sempre um grupo de colegas recrutas como ele, esta indicação estava reservada para todos aqueles que o capitão da companhia tinha escolhido para irem para cadetes da Escola de Oficiais Milicianos do Exercito sediada no convento de Mafra.
Numa das noites da semana de campo e em conversa com o Instrutor que era de Tomar uma cidade perto do seu local de nascimento, perguntou-lhe Carlos, o que tinham dado os psicotécnicos o instrutor confidenciou que tinham no registo a Arma de Engenharia. Nessa noite Carlos dormiu pouco, ir para Alferes e comandar um pelotão de homens isso era ir pela certa para profissional do “gatilho”, a outra opção seria continuar a carreira da família e aproveitar a oportunidade de aprender mais um pouco. Na manhã seguinte, Carlos tinha tomado a opção preferia a Engenharia ao gatilho da arma.
Deixou terminar a semana de campo e na volta ao Regimento de Infantaria Nº 5 pediu para falar com o capitão.

- Meu capitão dá-me licença. Perguntou na porta do gabinete.
- Entre instruendo, que pretende.
- Vinha informar o Capitão que sei que estou indigitado para ir para Mafra
O capitão interrompeu o discurso preparado
- E então não está contente
- Bem meu Capitão, também sei que os psicotécnicos me colocam na Engenharia e…
Novamente o Capitão o interrompeu
- Não venha com merdas, se não quer ir para Oficial diga logo, que outros estão em pulgas e na bicha para irem para Mafra.
- Meu Capitão prefiro a Engenharia, pois era o que fazia na vida civil.
- Mas agora já não é civil é militar e militar vai para onde o mandam, retire-se.
Carlos ainda esboçou argumentar mais um pouco, mas o capitão voltou à carga.
- Retire-se, é surdo.
- Carlos deu um passo atrás, bateu a continência, rodou sobre os calcanhares uma meia volta perfeita, bateu com o pé no chão e saiu do gabinete do Capitão.
- Foi ter com o Instrutor que lhe tinha dado o resultado dos testes e deu-lhe a indicação que o Capitão tinha ficado chateado com o pedido.
- É pá o gajo tirou aqui a recruta, depois foi para Mafra e fez uma comissão em Angola, na volta fez contrato por quatro anos, o tipo pensa que os que aqui chegam acham o máximo irem para Oficiais.
- O Gajo deve estar choné ou gostar muito da tropa, eu prefiro a Engenharia, mas se o gajo me foder, nada posso fazer, chumbar em Mafra não, que ainda vou parar a cabo.

Ultimo dia de recruta, mandaram a maralha formar na pequena parada da companhia, já todos tinha Jurado Bandeira.

Com a formatura na ordem de à vontade, começou o Capitão a indicar onde teriam de se apresentar os instruendos para a continuação da instrução militar, agora chamada de especialidade. A maioria ia para Tavira tirar a especialidade de Atirador de Infantaria, quando chegou a vez de Carlos, lhe foi dada a indicação que iria para Sapador de Engenharia, Carlos não se desfez, pois enquanto ia falando o Capitão não tirava os olhos dele.
Veio a ordem de destroçar Carlos dirigiu-se ao Capitão
- Meu Capitão, obrigado.
- Fique sabendo que você é parvo. Foi a resposta seca do Capitão enquanto se dirigia para a secretaria da companhia.
Parvo ou não, antes andar a comandar homens de pá e pica do que andar aos tirinhos na mata, foi este o pensamento de Carlos.

Pelas 13 horas o altifalante da aeronave voltou a funcionar, desta vez para dar a informação que iria ser fornecida uma refeição.

Carlos volta-se para o Cabo-Verdiano, que entretanto tinha adormecido.
- Pá os gajos sempre vão dar de almoço à rapaziada.
- O quê almoço, tá bem, já cá cantava, já. Respondeu o cabo-verdiano meio estremunhado do acordar repentino que a cotovelada de Carlos tinha provocado.


Karl d'Jo Menestrel
12/02/2010

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Gin Quanto Baste - Parte I - Primeiros Momentos * * A Partida * *

O Boeing 707 dos TAM (Transportes Aéreos Militares)

O autocarro passou a porta de armas onde dois soldados da Polícia Aérea faziam o controle e guarda e parou junto a um enorme hangar que serve ainda de recepção das tropas militares a embarcar.

Carlos nunca andou de avião, sentia o pequeno frio da primeira vez. O serviço militar é assim, “Maria vai com as outras”, alguns o que já eram conhecedores das manobras, começaram a dirigir-se para o grande portão do hangar que estava levemente entreaberto. Ao passar o portão, ficou espantado com o enorme vão livre de todo o hangar, aquilo era enorme, mais parecia um campo de futebol.

Se voltaram a reagrupar alguns grupos, mas a maioria se mantinha isolada, poucos eram os que se conheciam entre eles, coexistiam naquele imenso espaço umas 180 pessoas mais meia dúzia menos meia dúzia, de todas as mais diversas armas e patentes.

Estavam por ali especados, olhando uns para os outros que nem parvinhos que tinham perdido qualquer coisa e agora nada encontravam. Uns se encostavam ás paredes, outros de mãos dos bolsos, mais uns arranjando o dólmen, como se aquele andrajo tivesse por onde lhe pegasse. Carlos se mantinha calmo e em tudo reparava, um retirou a boina ajeitou o cabelo e a recolocou na cabeça com todos os cuidados, como em frente de um espelho estivesse e fosse mostrar pela primeira vez a farda “Feijão Verde” à namorada, Carlos sorriu com a presunção, outro esfregou os sapatos nas calças, por traz das canelas, mais uns que andavam de um lado para o outro não escondendo o nervosismo da sua primeira viajem aérea.

Num repente e pelas 11:00 um altifalante ribombou e uma voz masculina começou a dar informações.

- Linhas Aéreas Militares, Srs. passageiros queiram dirigir-se ao portão azul com o Bilhete que lhes foi entregue na mão.
Carlos não se moveu, deixou que os já sabidos se movessem primeiro, seguindo o velho princípio militar que tinha aprendido no tempo de recruta nas Caldas da Rainha “ Maria vai com as outras, se não sabes, esperas para ver”.

Voltou a voz no altifalante “ Embarque para Luanda e Beira”

Esta era nova para ele, passagem por Angola, “nada mau, telho família por lá, sempre vou dar um abraço, os gajos poderiam ter dito antecipadamente e avisaria a prima”, pensou Carlos, por fim entrou na fila, que isto da tropa é tudo na fila, na linha ou na bicha, não existe opção na escolha.

Chegou ao portão onde todos iam entregando o bilhete de embarque, onde um soldado da força aérea ia retirando parte do bilhete e entregando o restante de volta ao portador.

Caminhou para fora do hangar, sentiu o ar frio na face, parou para ler o que restava do bilhete, uma série de números onde um deles indicava a cadeira onde se sentaria no avião, Carlos disse entre dentes,
- Espero que seja junto a uma janela, sempre dá para ver por onde se passa.

Carlos pensaria que andar de avião é igual a carruagem de comboio!

A fila se manteve agora na direcção do Boeing 707 dos TAM, não teve de andar muito a aeronave estava junto ao hangar.

Reparou então no tamanho do avião o achou enorme, uns soldados levavam uma escada do tipo triângulo recto para junto da porta perto do “focinho” (Cockpit) do avião a fila tinha parado para as manobras necessárias na instalação da escada. Em terra se mantinha um soldado, todo aprumado que ia repetindo cuidado que os degraus estão húmidos enquanto a fila era engolida para o bojo da nave aérea.

Entrou pela primeira vez num avião, sorriu como criança, mostrou o bilhete ao soldado que executava a recepção e este lhe apontou por perto uma cadeira junto a uma janel. Ainda pensou “ ainda há anjos”, colocou o saco entre as pernas e manteve-se de pé vendo qual o comportamento a adoptar com o saco, reparou que alguns abriam a tampa de uma caixa e colocavam lá os haveres de mão. Reparou que ninguém usava mala, só o característico sacão militar. Imaginou que em lugar de bagagens como já tinha visto no Aeroporto da Portela o bojo do avião iria repleto de material militar, ou de material logístico mais urgente.

Novamente um altifalante, se fez ouvir.
Agora um Coronel das FAP informando que era o comande do voo e piloto principal tendo como co-piloto um Tenente-Coronel das FAP, lá disse o nome dele e do seu auxiliar. Deu indicações do tempo em Luanda e que chegariam dentro de 8 horas à capital Angolana.

Logo após ter falado o altifalante da aeronave se fez ouvir, outra voz, desta vez um cabo das FAP dando as indicações necessárias para o aperto dos cintos, iniciando de seguida uma ladainha sobre os procedimentos a ter em caso de alguma emergência.

Carlos vira-se para o passageiro que tem a seu lado e num desabafo.
- Para quê esta merda toda, se a lata cai nem o sebo dá para aproveitar, o outro deu um sorriso amarelo e se mudo estava, mudo ficou.

O avião inicia a marcha rolando lentamente para a pista, Carlos ia espreitando pela janela todo o movimento que se processava no exterior, perto da entrada da pista o aparelho parou, achando estranho o procedimento, tentou encontrar uma explicação para a paragem, muito pouco tempo se passou e lá volta a rolar agora para uma pista bem larga, se ouve o ensurdecedor ronco dos motores e o 707 começa a rolar cada vez mais veloz, percorrendo rapidamente a pista até que saiu de terra elevando-se rapidamente nos ares.

Respirou de alivio e da janela, via Lisboa, toda uma imensidão de casario, passando junto à ponte Salazar ficou admirado com a deslumbrante paisagem que dos ares se podia recortar.

Carlos não tirava os olhos de Lisboa, como de menino deslumbrado fosse. Ainda disse para consigo “Adeus Lisboa, assim que puder eu volto, prometo”. E voltou nem uma nem duas, volta sempre que pode, gosta de se sentar numa das esplanadas na Rua Augusta e ver as “garinas” passar.

Karl d'Jo Menestrel
10/02/2010

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Balada de Neve


Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
. Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!…
Porque padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

Augusto Gil

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Gin Quanto Baste - Parte I - Primeiros Momentos * * Nos Adidos**


8:00 da manhã, Carlos passou o enorme portão de acesso a Lanceiros 2, parou, percorreu com o olhar a enorme parada, procurando para onde se dirigir, por fim percorreu resoluto os longos metros que o separavam da construção principal e que ele achou que poderia ser a companhia de adidos. Reparou numa série de bancos de madeira, ia colocar o saco num deles, mas estavam molhados pela orvalhada da noite e da madrugado, resolveu colocar o saco na calçada e ficou expectante olhando ao redor, um cabo passou perto e Carlos lhe dirigiu a palavra.
- Nosso cabo, onde fica a companhia de adidos.
- Logo em frente. O cabo se aprontava para continuar a caminhada, quando novamente Carlos o interpelou.
- Não vejo ninguém por ali, quando abre a secretaria.
- Já abriu meu furriel, alguns já lá estão.
- Obrigado.
Agradeceu e pegando no saco se dirigiu para onde o cabo indicou. Transitou por uma porta larga e alta que deu acesso a grande sala, onde no final da mesma se encontrava um Primeiro-Sargento e diversos cabos. Entrou numa das filas onde já se apinhavam alguns com a mesma parida sorte. A fila andava rápido, só se ouvia a voz dos cabos e do Primeiro, no rosto de todos estava estampado o sorriso amarelo que a desdita ditava. Carlos reparou que a grande maioria eram jovens como ele, mas por ali estavam todas as patentes de um Exercito.
Chegou por fim a vez.
- Bom dia. Disse o cabo
- Carlos apresentou a documentação que lhe tinha sido entregue uma semana antes em Tancos na Escola Prática de Engenharia.
- Bom dia cabo.
- O Sr. tem de ir ter com o nosso Primeiro.
Carlos olhou para a esquerda onde estava um Sargento, entradote e pesado, saiu da fila e entrou na outra onde no principio da mesma estava de pé atendendo o Primeiro-Sargento.
 Chegou a sua altura de atendimento.
- Bom dia Primeiro. E voltou a apresentar a papelada, dois simples documentos e a sua caderneta militar.
- Bom dia. Retorquiu o Primeiro
- O Senhor já sabe para onde vai, não é verdade?
- Sei sim, vou para férias em Moçambique, respondeu Carlos metendo graça para desanuviar algum nervosismo que no momento sentia.
O Primeiro sorriu
- Espero que se divirta então. Ficando com os dois documento, entregando mais outros dois, mais um papel que mais parecia um bilhete de avião e continuou.
- Todos os documentos são para entregar na 2ª Companhia de Engenharia do Agrupamento de Engenharia de Moçambique, vai para Vila Cabral na Província do Niassa substituir um 2º Sargento a sua comissão é uma rendição individual, estes papelinhos. Apontado para o que parecia ser um bilhete de avião.
-É para entregar na Base Aérea e lhe será dado outro em troca, tenha então umas boas férias Furriel. Despediu-se assim o Primeiro ajeitando-se na brincadeira.
- Deus o oiça, Primeiro, já agora como vou para a Base.
- Um autocarro da Força Aérea os vêem buscar pelas 9:30
- Obrigado e bom dia para o senhor. Se despediu Carlos do Primeiro.
Voltou para a parada, desta vez colocou o saco num banco e se sentou em cima do mesmo enquanto sentia o aconchegante agasalho da gabardine militar.

Voltaram os pensamentos de sair. Ainda estava a tempo de sair pela porta de armas e dizer adeus a tudo, criar nova vida algures, nova identidade, pedir asilo político e sair do tormento de ideias.

Analisava os rostos, desde os mais jovens aos mais graduados, os mais velhos encontravam conhecidos de outras paragens e se juntavam em grupos, mas ele bem reparava que a tranquilidade dos mesmos era aparente. Novos e velhos levavam cigarros aos lábios em baforadas intermitentes, como esses fossem os últimos cigarros da vida.

Perguntou a um capitão se sabia de algum bar por ali, o capitão lhe indicou por onde ficavas o bar. Para lá se dirigiu.

Pediu ao soldado uma sandes de presunto e um refresco de laranja “Sumol”, um pacote de bolachas “Maria” para a viajem. Depois de saborear a sandes e a laranjada, pediu um café, o qual saboreou juntamente com um cigarro, pagou e lhe veio a ideia que seria a última refeição em solo Pátrio.

Chegara por fim o autocarro da Força Aérea, Carlos lembrou-se do irmão, que tinha partido para a Guiné como motorista da Força Aérea, por pouco não lhe vieram as lágrimas no momento, não tinha tido autorização do comandante do curso de minas que estava a tirar na altura, para se poder despedir dele no embarque. O nó que tinha na garganta se desfez quando ouviu chamar pelo nome para entrar no Autocarro pintado de azul.

Faltava um minuto para a hora que o primeiro tinha indicado 09:30.

Saiu o autocarro no sentido contrário que tinha percorrido anteriormente, atravessou Lisboa de ponta a ponta e absorveu todo um sentimento de despedida, olhando para tudo como da última vez se trata-se, lembrou-se da frase do cigano, “Ultima compra em Portugal”, mas logo pensou… puta que o pariu… merda de cigano.

Chegaram frente ao grande portão da Base Aérea de Figo Maduro, paredes-meias com a grande entrada de Lisboa o Aeroporto Internacional , também conhecido por da Portela.

Um último pensamento e ainda dentro do autocarro. “ Não existe volta a dar, agora é ir e voltar”

Karl d'Jo Menestrel
08/02/2010

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Gin Quanto Baste - Parte I - Primeiros Momentos * * Perguntar Ofende? **

Perguntar ofende?

Carlos subia a calçada da ajuda para se apresentar em Lanceiros 2, ia taciturno naquela manhã de inverno, recordava as últimas palavras do Pai e da Mãe, pois tinha-se despedido na madrugada, tinha saído da casa que lhe tinha sido até agora, o lar do seu recolhimento. Não queria que ninguém dos seus mais queridos por perto, naquela hora de separação. Momento que ele sentia como o mais delicado de sua vida, era o salto para o desconhecido, para todas as incertezas.

Tinha passado a semana a despedir-se da família, dos amigos e de todos os mais próximos, percorreu seca e meca para chegar perto de todos eles.
No pensamento lhe fervilhava as fontes, ainda estava a tempo de atravessar a fronteira e dar pulo até França ou mesmo a Argélia. Assim se veria livre da teia que lhe estava próximo a cercear toda a mocidade, vinte e dois anos plenos de força, jovialidade e saúde, que iriam descer aos infernos, ainda está a tempo de seguir o que não deixava dormir há algumas noites.

Na íngreme calçada, devidamente ataviado, dentro daquele fato se sentia apertado e o saco de viagem com poucos haveres lhe pesava como peso em excesso, pois se brigavam as vontades do menino e moço.

Acordou num repente dos seus pensamento obscuros, com a chegada do corpulento cigano.
- Senhor quer comprar um relógio? E toca de mostrar duas mãos cheias de relógios por entre uns lenços não muito limpos por tanto manuseio.
Carlos parou, olhou o cigano de alto a baixo, e continuo a subida, o cigano foi no encalço e continuou o cerco.
- Senhor são de excelente marca e dou garantia.
Carlos parou, olhou o cigano nos olhos e lhe retorquiu um seco.
- Não.
Voltando o vendedor contrabandista à carga.
- Não são caros os relógios e lhe fará falta, pois estes têm cronometro.
Novamente Carlos parou, voltou a olhar o cigano e com cara de poucos amigos.
- Meu amigo, o momento não é para comprar relógios, hoje estou imensamente chateado e sabe o porquê não sabe?
- Sei, mas que quer, é a vida.
- É uma vida de porra, nem sei se o que vou fazer é vida.
- Mas isso não o impede de ter um bom relógio.
Carlos não retorquiu e voltou à subida, alargou o passo, o largo portão de Lanceiros já estava perto. Mas o cigano, não queria largar a presa.
- Senhor lembre-se que é a última compra que faz em Portugal.
Aí Carlos desesperou “ última compra em Portugal”. A frase caiu como ave de mau agoiro. Parou novamente, virou-se para o cigano e lhe gritou.
- Porra! Largue-me de mão seu caralho.
O cigano não esperava uma acutilância tal e respondeu baixinho.
- O Senhor desculpe, “Mas perguntar ofende”?
Carlos, sorriu.
- Que tenha bons negócios…Atravessou a avenida e entrou em Lanceiros, onde o Soldado lhe apresentou arma, colocando-se em sentido.

Karl d'Jo Menestrel
07/02/2010

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Doce enlace


Sentado junto à lareira, leio um livro
A música de um saxofone me embala
No sabor da leitura, viro a página
Me paro, taciturno, me vens ao pensamento
Agora o som do piano me dá alento
Me corrige a razão, se me engano
Pois me percorre o doce estar alentejano.

Me levo na subconsciente paixão,
Me briga o íntimo na plena emoção
Sorrio, de imaginar estar perto de ti
Eu que estou tão perto e tão longe
Como ave esvoaçando ideia adquiri,
Sei que sabes... não nasci pra monge.

Me liberto das penas, para te abraçar,
Tu sorris sempre com meu chegar,
Iluminas a existência com teu enlace,
Nesta reflexão, sinto tua terna face.

Évora - 06/02/2010
Karl d’Jo Menestrel

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Estranho sentir


A vida é ingratidão
Cria laços no coração
Dá memória, solicitude
Coroa nova e livre atitude
Alimenta onda delirante,
Como vista de mirante
Brota sonho, letargia,
Iluminuras, integrante
Na raiz do meu ser
Factos para padecer
São alusões que retenho
Que na razão contenho

Estranho sentir por ti
Na frenética, forte ilusão
Que no espírito construí
Com enlaces de afeição
Estranho e doce sentimento
Que baralha pensamento
Corrompendo todo o ser
Que não busco esclarecer

Me azougo neste sentir
Por não te poder omitir.


05/02/2010
Karl d’Jo Menestrel

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Desejos vãos


Eu queria ser o Mar de altivo porte 
Que ri e canta, a vastidão imensa! 
Eu queria ser a Pedra que não pensa, 
A pedra do caminho, rude e forte! 

Eu queria ser o sol, a luz intensa 
O bem do que é humilde e não tem sorte! 
Eu queria ser a árvore tosca e densa 
Que ri do mundo vão e até da morte! 

Mas o mar também chora de tristeza... 
As árvores também, como quem reza, 
Abrem, aos céus, os braços, como um crente! 

E o sol altivo e forte, ao fim de um dia, 
Tem lágrimas de sangue na agonia! 
E as pedras... essas... pisa-as toda a gente!...


Florbela Espanca 
A Lírica Alentejana

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Se me levam as águas, Nos olhos as levo.

Se de saudade
Morrerei ou não,
Meus olhos dirão
De mim a verdade.
Por eles me atrevo
A lançar as águas
Que mostrem as mágoas
Que nesta alma levo.

As águas que em vão
Me fazem chorar,
Se elas são do mar,
Estas de amor são.
Por elas relevo
Todas minhas mágoas;

Que, se força de águas
Me leva, eu as levo.

Todas me entristecem,
Todas são salgadas;
Porém as choradas

Doces me parecem.
Correi, doces águas,
Que, se em vós m'enlevo,
Não doem as mágoas
Que no peito levo!
 
Luís de Camões
O maior de todos eles